DEPUTADO DO PAIGC DETIDO POR HOMENS ENCAPUZADOS E ACUSADO DE PREPARAR GOLPE DE ESTADO
Foi detido, na Guiné-Bissau, a 17 de Fevereiro, o deputado do PAIGC para a diáspora Flávio Baticã Ferreira. Homens encapuzados detiveram-no acusando-o de ter participado numa cerimónia ritual, com o objectivo de preparar um golpe de Estado. Contactado pela RFI, o advogado francês de Flávio Baticã Ferreira denuncia "pretextos falaciosos" e considera tratar-se de um "atentado grave contra a democracia que deve ser colocado perante a cena internacional".De
acordo com as primeiras informações, o deputado Flávio Baticã Ferreira
encontra-se actualmente, nesta terça-feira 18 de Fevereiro, detido nas
instalações do Ministério do Interior, em Bissau.
O
representante político da diáspora guineense na Europa reside habitualmente em
França. O advogado francês de Flávio Baticã Ferreira não conseguiu, até ao
momento, contactá-lo. Mas, segundo as informações que tem, foi detido depois de
ter participado numa cerimónia religiosa, sob pretexto de ter "preparado
um golpe de Estado".
"Flávio Ferreira é meu cliente há já algum
tempo. Ele está muito implicado na campanha política [guineense]. As
informações de que disponho é que chegaram milícias à sua casa. Decidiram
prendê-lo. Julgo que tinha estado numa cerimónia religiosa e quando o
capturáram alegaram que era uma prova de que estava a preparar um golpe de
Estado", relata o advogado. O que revela, de acordo com o mesmo,
"a pouca vontade do regime em respeitar as liberdades fundamentais".
O
deputado Flávio Ferreira, do PAIGC, já tinha alertado o advogado sobre os
receios que nutria em relação à sua segurança. "Muito envolvido na campanha política na Guiné-Bissau", diz
ainda Nicolas Ligneul, "Flávio Ferreira candidata-se às legislativas e apoia a candidatura do presidente [da
Assembleia Nacional Popular] Domingos Simões Pereira. Sentia-se em perigo, mas
mas sendo um homem corajoso, voltou para a Guiné-Bissau, apesar de o ter
advertido para não o fazer".
Apesar
de admitir que, a nível jurídico, pouco pode fazer a partir do território
francês, o advogado Niolas Ligneul afirma que "se trata de um atentado muito grave contra a democracia e as
liberdades fundamentais, que deve ser colocado perante a cena internacional,
por forma a que finalmente se reconheça a qualidade de ditador do Presidente
actual da Guiné-Bissau" e que "se possa finalmente organizar eleições livres neste país que bem precisa
delas".
"Organizar uma cerimónia
religiosa não é crime"
A
motivação da sua detenção, a confirmar, prende-se com a participação em
cerimónais religiosas. "Este é um
não-assunto", esclarece Bubacar Turé, presidente da Liga guineense
dos Direitos Humanos.
"Organizar cerimónias tradicionais não é um
crime naa Guiné-Bissau. Não há nenhuma lei que tipifica isso como crime. E
mesmo que fosse crime, a imunidade do deputado teria de ser levantada e um
processo teria de ser instaurado nos termos legais, através da Polícia
Judiciária", explica o defensor dos direitos humanos.
Bubacar
Turé recorda que, por ser deputado, Flávio Baticã dispõe de uma imunidade e
que, por essa razão, foi ilegalmente detido.
"A verdadeira razão [da detenção] tem a ver
com perseguições políticas. Estamos a lidar com um regime autoritário, hostil
às liberdades fundamentais, às vozes discordantes. O senhor Flávio já teve um
incidente com a polícia e já foi detido uma vez. É um deputado com imunidade
parlamentar, portanto não pode ser detido, a não ser nos casos de flagrante
delito", afirma Bubacar Turé.
"Tudo isto se enquadra na estratégia deste
regime autoritário de silenciar as vozes discordantes e tentar limitar o espaço
político aos opositores", diz ainda.
"Milícias ilegais do presidente
Sissoco Embaló estão alojadas no Palácio da república"
O
antigo primeiro ministro da Guiné-Bissau, Aristides Gomes, também radicado em
França, alerta para um factor comum a todas as recentes detenções. Segundo diz,
"são sempre homens armados e
encapuçados", portanto não identificados, o que o leva a falar em
milícias ilegais do presidente Umaro Sissoco Embaló.
"Não há nenhuma detenção que se faça através
da via judicial, através da Polícia Judiciária. Todas as detenções são feitas
pelo Ministério do Interior e eu diria que há uma coerência. Porquê? Porque as
instituições policiais tradicionais não são elas que perpetuam essa repressão.
Quem faz a repressão são as milícias do presidente Sissoco", afirma
Aristides Gomes.
"Já estamos habituados à ilegalidade deste
regime, mas o que eu quero mostrar é que por detrás, digamos, da das
instituições tradicionais da polícia, há sempre a penetração dessa milícia que
está alojada no Palácio da República e que habitualmente reprime, mas sob a
forma encapuçada".
Os
casos de espancamento e detenções arbitrárias têm sido vários, dentro e fora da
Guiné-Bissau. Militantes guineenses foram espancados em Odivelas, nos arredores
de Lisboa e em Paris, em Dezembro, à margem de um encontro entre o
Presidente guineense e a diáspora radicada em França, na véspera do
encontro entre os dois chefes de Estado.
De
acordo com Aristides Gomes, a situação pode ir agravando-se à medida que chega
o fim do mandato de Umaro Sissoco Embaló.
"Quanto mais nós nos aproximamos da data
fatídica de 27 de Fevereio, mais o Presidente estará uma situação de apuros.
Uma situação desagradável para ele. Portanto, a repressão irá intensificar-se.
Já começa".
Aristides
Gomes, primeiro-ministro da Guiné-Bissau de 2019 a 2020, do PAIGC, afirma ainda
que "o Estado guineense, sob
o regime de Sissoco, não conhece a aplicação do direito, baseia-se unicamente
na repressão".
Para
o político, "o discurso de Sissoco
sobre a ordem, a disciplina... remete-nos para o discurso salazarista que nós
já conhecemos. Enfim, o discurso fascista que nós conhecemos em toda a parte".
Até à publicação deste artigo, não foi possível obter a versão das autoridades, não obstante as tentativas feitas nesse sentido.
Notabanca;
18.02.2025






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