terça-feira, 19 de junho de 2018

CIPRIANO CASSAMÁ APRESENTA QUEIXA CONTRA O PGR NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 
O líder do Parlamento guineense, Cipriano Cassamá, com o patrocínio jurídico de cinco advogados do país, intentou uma queixa-crime contra o Procurador-Geral da República, Bacar Biai, junto do Supremo Tribunal de Justiça.
A queixa contra Bacar Biai tem que ver com o que Cipriano Cassamá considera de «violação do segredo de justiça, coação, calúnia e difamação»  contra o deputado Domingos Simões Pereira, antigo primeiro-ministro e atual líder do PAIGC.
A petição de Cipriano Cassamá, patrocinada pelos advogados Ruth Monteiro, Mário Lino da Veiga, José Paulo Semedo, Carlitos Djedju e Carlos Pinto Pereira, é a resposta do líder do parlamento ao posicionamento do Procurador que pretende ver levantada a imunidade parlamentar a Domingos Simões Pereira.
A procuradoria guineense quer ouvir Simões Pereira, mas os advogados que apoiam o Parlamento desconhecem o âmbito em que o político é convocado por Bacar Biai.
Na semana passada, a comissão permanente do Parlamento negou qualquer possibilidade de levantamento da imunidade parlamentar a Domingos Simões Pereira.
O líder do parlamento acusa o procurador de ter afirmado, num programa de rádio, que será da responsabilidade do parlamento «a decisão que vai ser tomada (...) sobre o suspeito Domingos Simões Pereira».
Os advogados que suportam a queixa-crime de Cipriano Cassamá consideram aquelas palavras de ameaças contra um órgão de soberania.
"A perseguição não é justiça."
Ler a queixa:


AO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Assembleia Nacional Popular, neste ato representado pelo seu Presidente, Eng.º Cipriano Cassamá

Vem, instaurar processo crime contra:

BACAR BIAI, Procurador Geral da República,

nos termos e com os fundamentos seguintes:

1.º

Através de um programa de rádio em que o PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA foi entrevistado pelo jornalista Sumba Nasil (programa Frequência Activa), a Queixosa tomou conhecimento de que o Dr. Bacari Biai decidiu tornar público a existência de um processo crime contra o Eng.º Domingos Simões Pereira e os factos que indiciam a prática do crime de administração danosa e usurpação de funções.

2.º

No dia 2 de Maio de 2018, por carta com a referência n.º 177/GPGR/2018, o Procurador Geral da República, dirigindo-se ao Presidente da Assembleia Nacional, solicitando instruções:
“... aos serviços competentes a autorizarem a audição do Deputado Domingos Simões Pereira, no âmbito do processo de resgate, por ter sido constituído suspeito vai ser ouvido nessa qualidade, num inquérito que corre os tramites legais, na Câmara Criminal da Procuradoria Geral da República”.

3.º

A carta em questão (doc. n.º 1) foi acompanhada de um pedido de levantamento de imunidade parlamentar do deputado Domingos Simões Pereira, por ter sido constituído suspeito ... e de um despacho, contendo factos e crimes imputados ao deputado, como se de um verdadeiro despacho de acusação se tratasse. Cfr. documentos n.ºs 2 e 3.

4.º

Reunida a Comissão Permanente da ANP, foi tomada a deliberação n.º 05/2018 de não atender o pedido de levantamento da imunidade parlamentar ao deputado Domingos Simões Pereira, com o voto favorável de 14 dos seus membros e um voto de abstenção, e remetido ao ora denunciado, na qualidade de PGA, os fundamentos da deliberação, através do Ofício n.º 125/GP/ANP/2018. Doc. n.º 4.

5.º

Inconformado com a deliberação da Comissão Permanente, o ora denunciado decidiu, mais uma vez, recorrer à Comunicação Social, para apelar, entre outros, o deputado Domingos Simões Pereira para que se colocasse à disposição do tribunal, e dessa forma violou a Constituição e o Regimento da ANP, conforme aliás foi cabalmente referido no Comunicado de Imprensa daquele órgão de soberania, à posição pública do ora denunciado. Cfr. documentos n.ºs 5 e 6.

6.º

Com data de 4 de junho de 2018, e Referência n.º 195/PGR/2018, o Senhor Bacari Biai, ou Bacar Biai, assina, na qualidade de Procurador Geral da República e Presidente do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público uma carta dirigida ao Senhor Presidente da Assembleia Nacional Popular, nos termos da qual refere que “... será da inteira responsabilidade da Assembleia Nacional Popular a decisão que vai ser tomada pela Procuradoria-Geral da República sobre o suspeito, se a ANP não remete a deliberação da Comissão Permanente para sua apreciação pelo Plenário na sessão seguinte da Assembleia, conforme manda o artigo 11.º n.º 2/2010 de 25 de Janeiro.” Doc. número n.º 7 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido.

7.º

Com as declarações prestadas em direto na rádio capital, num dos programas de maior audiência a nível nacional, o Senhor Procurador Geral da República promoveu um julgamento na praça pública de um deputado da nação, que exerceu funções de chefe de governo, por força de eleições livres, justas e transparentes, funções essas das quais foi afastado por razões e com fundamentos que, por serem de conhecimento público, não precisam de ser carreados aos autos.

8.º

Essas declarações públicas constituem crime de calúnia e difamação, nos termos do 126.º do Código Penal, agravado pelo facto de ter sido praticado através de um meio de comunicação social e contra quem desempenhou funções públicas, desempenha funções políticas, e os atos referidos pelo ora denunciado foram praticados no exercício das funções públicas pelo Eng.º Domingos Simões Pereira (artigo 127.º alíneas a e b) do n.º 1), para além de constituírem crime de coação contra o mesmo deputado Domingos Simões Pereira, crime esse igualmente agravado por ter sido cometido por um Procurador Geral da República, numa atitude de clara, flagrante e grosseira violação das suas funções.

9.º

Se relativamente à honra e consideração devidos ao deputado da nação Domingos Simões Pereira, e à coação contra ele exercida pelo denunciado, a ANP não tem legitimidade para apresentar a presente queixa crime, já o mesmo não se pode dizer do comunicado de imprensa em que se dá a conhecer à população em geral a existência de processo crime contra o deputado, uma vez que a violação do segredo de justiça é um crime público, e como tal deve ser apreciada a presente denúncia.

10.º

Quando o denunciado ataca a ANP porque a Comissão Permanente não ordenou o levantamento da imunidade parlamentar, e a coage a praticar determinados atos, viola a lei, de forma grosseira e leviana, numa manifestação de poder e de força, que apenas envergonham o país, e realçam as fragilidades de uma instituição que devia ser exemplar, nos seus atos e declarações públicas.

11.º

Na carta referida supra, o PGR ameaça a ANP e o deputado da nação, caso aquela não cumpra com a sua exigência de remeter a deliberação da Comissão Permanente para a Plenária.

12.º

Não é admissível que um PGR viole flagrantemente a lei, cometa crimes com os seus comunicados e ofícios e se arme em justiceiro, dizendo que“... nenhuma manobra dilatória, de quem quer que seja, pode remover o Ministério Público, no concernente a combate a corrupção e demais crimes”.

13.º
Como se não bastasse ver um alto magistrado a cometer tantos erros gramaticais e de vocabulário numa frase tão pequena, vemos um Procurador Geral da República praticando atos que indiciam claramente a prática de vários crimes a arvorar-se em perseguidor dos criminosos.

14.º

Conforme descrito supra, dúvidas não restam de que o denunciado, nas vestes de Procurador Geral da República, viola o segredo de justiça; promove um julgamento na praça pública de um cidadão e deputado da nação, acusando-o da prática de crimes; convida um deputado da nação a violar a Constituição e a lei, comparecendo perante o Ministério Público para ser ouvido, na qualidade de suspeito, sem respeito pela Constituição e o Regimento da Assembleia Nacional Popular; e por fim, ameaça tomar medidas contra o deputado, caso a ANP não aja de acordo com as instruções que refere no documento n.º 7, ora junto. Cfr. doc. n.º 8.

15.º

O crime de coação contra órgão constitucional foi cometido pelo Senhor Bacar Biai quando, sendo ele titular de um cargo político nos termos do artigo 3.º da Lei 14/1997 – Cargos Políticos - escreve ao Presidente da ANP coagindo-o e tentando dessa forma obstaculizar o livre exercício das funções próprias e exclusivas da ANP.

16.º

Por último, e não menos importante nesta panóplia de comportamentos erráticos do senhor Bacar Biai, está a inovação de declarar (publicamente) um sujeito SUSPEITO, sem o notificar imediatamente dessa qualidade, sem o ter ouvido nessa qualidade e sem lhe informar dos seus direitos e obrigações, violando assim flagrantemente os artigos 60.º n.º 2 e 3, e 61.º do Código de Processo Penal.

17.º

Perante esta atuação do Ministério Público, fica-nos a questão de saber se estamos perante uma violação intencional da lei, por parte de quem tem o dever de perseguir os que a violam, ou se de deficiências técnicas gravíssimas e profundas se trata, por quem tinha a obrigação de conhecer e dominar a legislação penal em vigor, já que a ignorância ou deficiência da sua legis arte se repercute, de forma grave e muitas vezes com prejuízos irreparáveis, sobre o cidadão.


18.º

É para a queixosa difícil de entender que um Procurador Geral da República não consiga perceber que o artigo 11.º n.º 2 da Lei 2/2010 se refere ao assentimento do levantamento da imunidade parlamentar, assentimento esse que não aconteceu, uma vez que a Comissão Permanente deliberou não assentir nesse levantamento. Não existindo assentimento, nada há para ser agendado na plenária, pelo que a ignorância da lei, manifestada pelo denunciado, na resposta musculada que endereçou à ora queixosa é, simplesmente, lamentável.

19.º

E, não é, CLARAMENTE, competência do Senhor Bacari ou Bacar (como por vezes se identifica) Biai, enquanto Procurador Geral da República, instruir a ANP e a Comissão Permanente sobre as suas competências, principalmente quando tal comportamento se baseia numa interpretação pessoal e distorcida da lei.

20 º

O ora denunciado está consciente e tem perfeito conhecimento de que a sua conduta não é permitida por lei, até porque faz parte do escopo das suas atribuições perseguir criminalmente quem atue da forma como ele atuou, e que vem referida na presente queixa.

21.º

O dolo com que o participado atua é por isso intenso.

Termos em que deve ser recebida a presente queixa e, nos seus termos, ser o denunciado Bacar Biai, que também usa Bacari Biai, acusado pela prática do crime de violação do segredo de justiça p. e p. pelo artigo 237.º do Código Penal; crime de coação contra órgãos constitucionais p. e p. pelo artigo 12.º n.º 1 da Lei 14/97 de 11 de Agosto e crime de abuso de poderes, p. e p. pelo artigo 24.º do mesmo supra citado diploma legal, seguindo-se os ulteriores termos até final.

Mais declara a queixosa que, por ter legitimidade, nos termos supra expostos (artigo 66.º e 67.º do CPP) requer a sua constituição como Assistente, devendo, para o efeito ser emitida a competente guia para pagamento do imposto de justiça.

Os Advogados

Carlitos Djedjo

Carlos Pinto Pereira

Ruth Monteiro

José Paulo Semedo

Mário Lino da Veiga
 
Notabanc; 19.06.2018

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