“CEDEAO ESTÁ A CUMPRIR AGENDA DE UMARO SISSOCO EMBALÓ”-Diz Fodé Mané
O Chefe de Estado guineense, Umaro Sissoco Embaló, anunciou a realização de eleições gerais para o próximo dia 30 de Novembro, enquanto a oposição e a sociedade civil reclamam a marcação dos dois escrutínios em Maio, alegando que o mandato de Umaro Sissoco Embaló termina nesta quinta-feira, 27 de Fevereiro. A decisão do Presidente guineense de marcar as eleições coincidiu com a chegada de uma delegação da Comunidade dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) a Bissau, para resolver o impasse político que se vive no país. O jurista e ativista Fodé Mané reconhece que a decisão do Presidente não foi inconsciente e acusa a CEDEAO de estar a cumprir a agenda de Umaro Sissoco Embaló.
O Chefe de Estado guineense, Umaro
Sissoco Embaló, anunciou a realização de eleições gerais no próximo dia 30 de
Novembro. O senhor considera que esta decisão vai resolver o impasse político
que se vive no país?
A nossa
Constituição prevê que o mandato de um Presidente da República dura cinco anos
e a eleição deve ser marcada no último ano do mandato. Então, devia ter sido
marcada 90 dias antes do fim do mandato, ou seja, até 27 de Novembro de 2024 (o
que não aconteceu). No processo de marcação das eleições é necessário haver
concertação entre as várias entidades: partidos políticos, porque são eles a
concorrer, o Governo, a entidade que disponibiliza meios e organiza, e a
Assembleia Nacional, que aprova toda a resolução do Governo. Não tendo havido
essa concertação, comprovamos, mais uma vez, que a única voz, a única lei, é a
do chefe de Estado, que determinou o dia 30 sem concertar com ninguém,
ultrapassando todos os prazos. Mas não foi inconsciente; fez coincidir o
anúncio com a visita da missão da CEDEAO.
O anúncio do Presidente coincide com a
chegada de uma delegação da CEDEAO ao país para mediar a crise política. O que
é que pode fazer agora a CEDEAO?
A CEDEAO pode
legitimar apenas a decisão de Umaro Sissoco Embaló. É o que está a fazer. A
decisão de enviar uma missão de alto nível foi tomada no dia 15 de Dezembro de
2024, mas só chegou ao país no dia 24 de Fevereiro, com uma agenda que foi
deliberadamente alterada. Porque, em princípio, devia encontrar-se com todos os
atores nacionais como uma forma de buscar uma solução, ou seja, todos os
partidos políticos legalmente constituídos, principalmente as duas maiores
plataformas: Aliança Patriótica Inclusiva, designada API, e o PAI Terra Ranka,
que tem o PAIGC como o principal partido, uma coligação que ganhou as últimas
eleições. Apesar de neste momento sabermos que a Assembleia Nacional foi
bloqueada, a nossa lei diz que o Presidente do Parlamento [Domingos Simões
Pereira] e a Comissão Permanente são os órgãos legitimamente eleitos. Porém, é
público que a CEDEAO endereçou uma carta dizendo “uma presidente interina”
[Adja Satu Camara], designada por Sissoco, o que é totalmente ilegal. Sabe-se
ainda que, em vez de falar com o API, vai falar com o PRS, ala de Félix
Nandunga, que integra o atual Governo, e foi Satu Camara que “cozinhou isso
tudo”, inclusive na Assembleia. A CEDEAO não tenciona reunir-se com Braima
Camará nem com Fernando Dias, porque esses foram descartados por Umaro Sissoco.
No que diz respeito às organizações da sociedade civil, está previsto que reúna
com a Liga Guineense dos Direitos Humanos. O que me leva a concluir que a
CEDEAO está a agir de acordo com a agenda do próprio Umaro Sissoco Embaló.
Está a afirmar que o trabalho da CEDEAO
não inspira credibilidade?
Não! São
pessoas que vieram viajar para receberem o seu per diem e legitimar esta
situação, tendo em conta o calendário de Umaro Sissoco Embaló. Sabemos que vão
sair daqui no dia 28 de Fevereiro, quando o mandato do Presidente termina no
dia 27, depois vão levar aquela morosidade para produzir um relatório. Tudo
isto vai coincidir com Junho, data da próxima reunião dos chefes de Estado da
CEDEAO, e nessa reunião vai-se tomar uma deliberação que vai ao encontro do que
foi anunciado antecipadamente por Sissoco Embaló. Ele quer fazer a eleição,
auto-legitimar-se a 30 de Novembro e, inclusive, já anunciou a tomada de posse
para Fevereiro de 2026. Isso tudo com uma ilegalidade tremenda, grosseira
violação da lei e com todo o beneplácito da CEDEAO e não só, uma vez que até a
CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) pode cair nisto.
A oposição quer realizar eleições dentro
de 90 dias. Que respostas poderá dar a CEDEAO às exigências da oposição?
Estas
exigências não são apenas da oposição; a sociedade civil também já entendeu que
estamos numa situação de impasse e não há forma de desatar isso. Deve haver uma
solução política que deve ser encontrada o mais rapidamente possível com a
legitimação das instituições. Isso começa com a realização das eleições, mas
também com a possibilidade de desbloqueio das instituições. Concretamente, a
Assembleia Nacional Popular, a sua Comissão Permanente e a sua Mesa, para poderem
legitimar a situação que se vive no Supremo Tribunal. A Comissão Nacional de
Eleições, que caducou em 2022.
De acordo com a Constituição guineense,
no dia 27 de Fevereiro termina o mandato de Umaro Sissoco Embaló. De acordo com
a lei, deverá ser o presidente da Assembleia Nacional, Domingos Simões Pereira,
a assumir a liderança do país até que sejam marcadas eleições?
Legalmente, é
ele [Domingos Simões Pereira]. Assim, vamos ter todos os atos praticados por
Sissoco, porque ele tem força, tem militares, tem a Guarda Nacional para
aplicar, mas juridicamente são atos inválidos. Significa que, no dia em que não
estiver em condições, será responsabilizado ou responsabilizadas todas as
pessoas que praticarem algumas ações com base em atos jurídicos inválidos.
O antigo secretário de Estado dos
Transportes e Comunicações, num dos governos do PAIGC, João Bernardo Vieira,
defendeu que o mandato do atual presidente da Guiné-Bissau termina, de facto,
no próximo dia 27, conforme a Constituição, mas que este só deverá desocupar o
Palácio com a posse do novo presidente eleito. O senhor concorda com este
argumento?
No início do
seu argumento é claro, baseou-se na lei. Agora, o que não ficou claro é quando
é que haverá a tomada de posse? Os atos praticados são válidos ou não? Qual é a
responsabilidade de alguém que praticou um ato sem ter mandato para isso?
João Bernardo Vieira diz ainda que é
preciso não confundir o término do mandato com vacatura…
Isso já é a
sua opinião, o seu entendimento. A lei diz que, se houver vacatura, é o
presidente da Assembleia [que assume o poder]. Se ele não quer reconhecer o
presidente da Assembleia, o problema é dele.
O advogado guineense Luís Petit entende
que a solução deverá ser um consenso político com a ajuda da comunidade
internacional. Na sua opinião, é
possível realizar eleições em 90 dias?
Se houvesse
coerência por parte das instituições e dos países que se dizem democráticos,
sim! Já havia disponibilidade de oferecer urnas e, quanto à campanha, não é o
Estado que financia cada candidato. São os partidos que arranjam os meios.
Acredito que os países democráticos, como a França, a União Europeia, os
Estados Unidos ou a CPLP, têm moral para poder impor uma solução democrática.
O chefe de Estado Umaro Sissoco Embaló
poderá aceitar a realização de eleições em 90 dias?
Nunca vai
aceitar, nem mesmo na data que avançou, 30 de Novembro. Não vai aceitar porque
ele quer governar pela via da força. Só se houver alguma pressão,
principalmente dos seus parceiros.
Notabanca; 26.02.2025

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